terça-feira, 13 de setembro de 2011

Basta!


Conheces-me bem e sabes que assim sou, pessoa de princípios, que quando toma uma decisão, difícil será voltar atrás e para o bem e para o mal, especialmente naquelas decisões pensadas, maceradas e objectivadas pelo tempo.

A relação que mantemos firme desde 1976, embora tudo tenha começado um ano antes com fugazes encontros, está a chegar ao fim. Não te lamento, mas também não te júbilo.

Foste o meu companheiro de estrada durante anos e anos e estiveste ao meu lado nos bons e maus momentos.
Lembro-me bem de quem foste nas minhas longas noites de estudo para os exames da faculdade; aconselhaste-me quando conheci a mulher com que decidi passar a perpetuidade; estavas ao meu lado quando me casei; foste o primeiro a quem contei que haviam nascido os meus filhos; lamuriei-me a ti com a partida dos meus mais queridos; acompanhaste-me nas boas e más decisões que tenho tomado pela vida fora e foste, umas vezes em maior ou menor número, sempre presente.

Deste-me muito, mas também tudo te dei de mim física e mentalmente, talvez bastante mais do que imaginas ou poderias afirmar, se tal te fosse possível.
Recordo-me de algumas vezes que por ti fisicamente quase me anulei, especialmente quando tentava ultrapassar os meus limites e mais longe chegar eu tentava. Vinhas em forma de catarro, em forma de fadiga, ou numa tosse ininterrupta que por vezes me enevoava o espírito quando eu de ti exagerava.

Foste companheiro de noitadas divertidas em convívio ameno em bares e discotecas e apreciaste a maior ou menor seriedade das conversas em jantares com amigos comuns; contigo fiz parcerias em transformadas situações, algumas até liminarmente conflituosas; desde aquele dia…, naquele ano…, acompanhaste-me para todo o lado até mesmo em reuniões importantes quando ainda te era permitido estar presente; fizemos juntas longas caminhadas e extensas viagens de avião, onde por vezes te perdia e logo te buscava em qualquer “free shop” para que juntos retornássemos a casa, em doses de unidades industriais; eras companheiro fiel nas noites mal dormidas quando, a meio delas, me levantava e clamava pela tua presença.

Dizem-me e sei que é verdade que nos últimos meses tenho de ti abusado, mas tudo isso é o fruto do stress que me originam os projectos novos que tardam em encontrar o seu caminho, mas também pelos antigos que adiam ou logram as expectativas que deles mentalizei. Mas digo-te firme e garanto-te que não será por muito mais tempo que te vou ter como companheiro. Resolvidos os problemas e finalizados os objectivos, que há muitos mas muitos meses me propus, garanto-te que te vou apartar.

Poderás pensá-lo, mas nada tem a ver com o facto de te teres inflacionado da forma que o fizeste nestes últimos anos. Não será por isso, mas deixar-te-ei sem mágoa alguma. Digo-te que o prazer que me davas pela tua companhia e pelo vício em que te transformaste, deixou de me agradar e deliciar. A sensação de que quando te respirava éramos um só, acabou, não existe, suporto-te porque tem de ser. Mas porque teremos de conviver se, do que exista da nossa relação, já quase nada resta?

Odiado por uns, amado por outros, a cada dia que passa és proibido de frequentar um, e mais um, e mais um lugar. Por cada lugar que te impedem de frequentar, mais difusão fazem de ti. Dizem ainda que a cada dia que passa és cada vez menos solicitado, quando eu acho que é só para de ti fazerem publicidades que o afirmam, e as estatísticas até o comprovam.

No que a mim diz respeito, as conversas que hoje em dia mantemos são já vagas de conteúdo, quando antes eram perenes e recheadas dele. E é estranho estar na tua companhia e por onde quer que passe ver o teu nome…, sim o teu nome… o teu nome em tablóides e esses cada vez mais em tons de vermelho, e cada vez menos em tons de azul. Por mim, nada existe contra o vermelho…, embora prefira o azul do céu mas…

…mas será que vejo a teoria da conspiração onde ela não existe, ou a cada dia que se transpõe e te proíbem ainda mais, tudo isso é feito quiçá, na ânsia de por ti aumentar a dependência, pois o fruto proibido é o mais apetecido?

Tentei já por duas vezes abandonar-te e sempre voltei, cabisbaixo, remoído pelo sentimento de culpa e pelo desânimo de não te ter deixado, tal dependurado no último suspiro, e ouvindo as vozes circundantes denunciando o culpado na corda.

Acho que desta vez não haverá retorno!
Não quero permitir-me cair novamente na tua tentação, enredar-me na tua teia, estar dependente de ti todo o dia e até por vezes de noite; quero fugir de ti e não tornar novamente a uma companhia que eu sei, dela querer libertar-me.

Vou querer ser mais puro sem ti.
Vou querer correr novamente sem te ter a sair-me das entranhas como um corpo estranho entalado na garganta.
Vou querer levantar-me de manha e não me sentir cansado e não mais cansado ficar, logo após o café da manhã, só de em ti pensar porque não estás presente.
Vou não mais correr arfante para te encontrar na primeira banca, no primeiro estabelecimento, no primeiro quiosque, como se sem ti…, eu nada fosse.

Por tudo isto..., e por muito, mas muito, muito mais…, brevemente este teu velho companheiro vai abandonar-te.
E dentro de pouco deixarás de fazer parte da minha vida, em definitivo.

Ficará para a memória a recordação das caminhadas que fizemos juntos e nelas, a minha submissão por ti.

Dentro de pouco…, muito em breve…, estarás sem mim meu parceiro…, meu cigarro.

Basta!

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